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“Os Rejeitados” não é só mais um filme de Natal.

Aline Duarte da Graça Rizzo
Professora Adjunta da Universidade Estadual do Ceará (UECE)
Integrante do Grupo de Estudos do Tempo Presente (GET/UFS/CNPq)

Cartaz de divulgação do filme. Disponível em: https://www.adorocinema.com/filmes/filme-293640/

Não é só mais um filme de Natal. Aliás, Os Rejeitados está longe de ser uma história previsível com obviedades cansativas. A obra do diretor Alexander Payne – vencedora de dois Globos de Ouro e indicada ao Oscar 2024 – também não entrega um final redentor e espetacular, mas sim prosaico tanto quanto profundo.

O grande trunfo do filme é apresentar um encontro improvável, e nada (ou muito) banal, entre personagens que compartilham as dores da rejeição e frustração vividas em experiências e tempos completamente diversos. Questões complexas são trazidas à baila com leveza, humor, mas também com densidade e muita sensibilidade.

Cenas como a da sobremesa de cereja (sem spoilers!) mostram a importância de encontrar o genuíno prazer no possível, o que pode ser ainda melhor que buscá-lo no ideal inatingível. Encarar a dureza da vida encontrando nas fissuras espaços de paz e satisfação talvez seja seu principal mote.

Há ainda algumas sutilezas que merecem destaque. Mary Lamb não teve o nome escolhido à toa. Em plena guerra do Vietnã, a personagem lida com o luto do filho que, em vulnerabilidade social, encontra no serviço militar um meio de ascensão. A crítica reverbera o racismo e a desigualdade da sociedade estadunidense que põe na linha de frente seus jovens rejeitados. Voltando ao nome, não parece um acaso Mary (Maria) ser a alcunha da mãe do combatente Lamb, (cuja tradução é “cordeiro”) sacrificado na guerra, tal qual a figura de Maria, mãe do Cristo, o cordeiro rejeitado e imolado. A cena de Mary Lamb com sua irmã grávida ainda contrapõe de forma belíssima a morte e a vida na experiência materna, tal qual o Natal busca simbolizar.

Embora a fotografia e as técnicas de som e edição criem um clima dos anos 1970, a película evidencia mais os diálogos dos três personagens que o ambiente. As falas tocam em questões atemporais sem qualquer preocupação em marcar uma época específica. Temas como saúde mental, parentalidade, aprofundamento da desigualdade social e conflitos geracionais aparecem como nos debates mais contemporâneos.

Definitivamente, Os Rejeitados não é mais um filme de Natal, não é só um filme de Natal, ou só mais uma dramédia óbvia. É uma obra profunda e densa tanto quanto leve e sensível. Mistura de forma tocante o trivial e o extraordinário.

Originalmente publicado em: https://infonet.com.br/blogs/getempo/os-rejeitados-nao-e-so-mais-um-filme-de-natal/ em 15/02/24


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