Prof.ª Dr.ª Andreza Maynard
Universidade Federal de Sergipe
Grupo de Estudos do Tempo Presente (GET/UFS/CNPq)
Madrugada. No quartel do 28º Batalhão de Caçadores, os soldados são acordados às pressas e recebem ordens de prontidão. Militares armados se deslocam pelas ruas de Aracaju em direção ao Palácio do Governo e à guarnição do Batalhão Policial. Tiros são disparados. Um automóvel para em frente à residência do governador. Graccho Cardoso sabia que aquela não era uma visita de cortesia. O que ele desconhecia era que Sergipe assistia ao início da revolta tenentista de 13 de julho de 1924.
Aquilo tudo era tão novo, que sequer tinha nome. Só décadas mais tarde os historiadores atribuíram à série de levantes ocorridos nos quarteis do exército, entre a década de 1920 e 1935, a definição de tenentismo. Isso porque tais insurreições foram lideradas por oficiais de baixa patente, sobretudo os tenentes.
No caso de Sergipe, o capitão Eurípedes Esteves de Lima, junto com os tenentes João Soarino de Melo, Augusto Maynard Gomes e Manoel Messias de Mendonça lideraram uma revolta iniciada no quartel do exército e tomaram o controle do estado.
O comandante do 28º BC, major Jancinto Dias Ribeiro, foi rendido e mantido prisioneiro junto com outros oficiais e autoridades, dentre os quais estava o governador. O prefeito de Aracaju optou por se afastar da cidade. Já o 2º tenente médico Erônides Ferreira de Carvalho viajou até Propriá para encontrar o coronel Francisco de Porfírio, a pedido de Graccho Cardoso. Sua missão consistia em enviar 2 mensagens telegráficas, uma ao presidente Arthur Bernardes e outra ao coronel Marçal Nonato de Farias, na Bahia, para comunicar sobre o que havia acontecido.
E se, por um lado, a revolta em Sergipe tornou evidente o bom entendimento entre Graccho Cardoso e o coronel Francisco Porfírio de Brito, por outro, evidenciou que nem todos os coronéis faziam oposição aos rebeldes. No dia 19 de julho, o Diário Oficial do Estado publicou um telegrama no qual o pai do 1º tenente Augusto Maynard o parabenizava e fazia “votos pela vitória da causa que nós abraçamos e que tu, com tanta abnegação e patriotismo, defendes”. A correspondência era assinada pelo “coronel Manoel Gomes da Cunha”.
Os rebeldes afirmavam estar lutando pela moralização do sistema republicano, numa alusão às fraudes comuns durante os períodos eleitorais. Quando os rebeldes tomaram o poder em Sergipe, lançaram um manifesto à população garantindo que permaneceriam no governo até que alguém fosse escolhido democraticamente pelo povo.
Outro ponto sensível dizia respeito à indisposição do Exército com o presidente Arthur da Silva Bernardes, acusado de ter escrito cartas nas quais o marechal Hermes da Fonseca, figura de prestígio entre os militares, era chamado de “sargentão sem compostura”. Mais tarde foi provado que as cartas eram falsas, mas à época serviu para aumentar a tensão entre civis e militares.
A exemplo dos colegas de farda paulistas, que haviam se rebelado em 5 de julho de 1924, os revoltosos sergipanos exigiam a deposição do presidente Arthur da Silva Bernardes. Os insurretos acreditavam que iriam conseguir o apoio de outras unidades militares, o que não ocorreu. Pelo contrário, forças da Bahia, de Alagoas e Pernambuco foram enviadas para restaurar a ordem.
Em 1924, além de desrespeitarem a hierarquia militar, os rebeldes desobedeceram às leis brasileiras e usaram dispositivos como a força e o autoritarismo. Ao invés de garantirem o cumprimento da Constituição, de assegurarem a ordem pública, os rebeldes fizeram o oposto. Eles foram isolados e cercados. A revolta capitulou em 2 de agosto. Os líderes da revolta fugiram; todavia, acabaram presos e punidos com severidade.
Contudo, a chegada de Getúlio Vargas ao poder, em 1930, mudou a sorte dos oficiais que lideraram as insurreições tenentistas. Naquele mesmo ano, Augusto Maynard Gomes foi nomeado interventor federal, cargo que ocuparia até 1935. Outrora acusado de traidor e condenado a vários anos de reclusão, Maynard retornava a Sergipe como autoridade máxima do estado. Ele iria encontrar Erônides de Carvalho no 28º BC. As divergências entre os dois não haviam ficado no passado e se tornariam cada vez mais evidentes. A participação dos militares na política, nacional e sergipana, estava longe de ser uma página virada na História.
Para saber mais:
DANTAS, José Ibarê Costa. O Tenentismo em Sergipe: Da Revolta de 1924 à Revolução de 1930. 2 ed. Gráfica J. Andrade Ltda. Aracaju, 1999.
MAYNARD, Andreza Santos Cruz. A Caserna em Polvorosa: A Revolta de 1924 em Sergipe. São Cristovão, Ed. UFS, 2012.
Originalmente publicado em: https://infonet.com.br/blogs/getempo/a-revolta-tenentista-de-13-de-julho-de-1924/ em 13/07/2023