Liliane Costa Andrade
Doutoranda em História Comparada (PPGH/UFRJ)
Orientador: Prof. Dr. Dilton Cândido Santos Maynard
Integrante do Grupo de Estudos do Tempo Presente (GET/UFS/CNPq)
E-mail: liliane@getempo.org
Após duas anexações bem-sucedidas, Áustria (Março/1938) e Tchecoslováquia (Março/1939), as primeiras tropas nazistas iniciaram a invasão à Polônia em 01 de setembro de 1939. Dois dias depois (03 de setembro), Inglaterra e França declararam guerra à Alemanha, dando início àquele que se tornaria o maior conflito do conturbado século XX. Com uma duração de seis anos (1939-1945), a II Guerra Mundial foi marcada, dentre outras coisas, por grandes batalhas e operações, a exemplo de “Dínamo”,
Ocorrida em maio de 1940, a operação “Dínamo” foi organizada pelo governo britânico e teve como principal objetivo realizar a evacuação, através das praias de Dunquerque (França), do maior número possível de soldados do bloco Aliado, que estavam sendo pressionados e cercados pelos nazistas. Ao longo de sete dias, 222 navios de guerra e 665 embarcações civis colaboraram no resgate de 338.226 homens. Considerada um sucesso, “Dínamo” inspirou o enredo de dois recentes longas-metragens: O Destino de uma Nação (Darkest Hour) e Dunkirk.
Lançado em setembro de 2017, O Destino de uma Nação é um filme britânico, com duração de 125 minutos e foi dirigido por Joe Wright. Do gênero dramático, o enredo da película gira em torno de Winston Churchill (Gary Oldman), nos seus primeiros dias como primeiro-ministro do Reino Unido, após a saída de Neville Chamberlaim (Ronald Pickup). O longa apresenta um Churchill simpático, divertido, atencioso diante dos anseios da população e, principalmente, como um grande líder, cujo esforço foi determinante para a criação da operação “Dínamo”.
Enquanto as tropas Aliadas eram encurraladas pela Alemanha, o primeiro-ministro, conforme é retratado no celuloide, enfrenta o Parlamento Britânico, tendo em vista um grupo ser favorável ao estabelecimento de um acordo com os fascistas na tentativa de evitar um novo conflito mundial. Ao passo que resistia à ideia, Churchill buscava apoio dos Estados Unidos, que naquele momento ainda mantinha uma posição de neutralidade, e da população civil, que foi mobilizada para participar do resgate aos soldados em Dunquerque. A cena final do filme traz Churchill no Parlamento realizando seu famoso discurso, que contém trechos como: Nós lutaremos nas praias, nós lutaremos nos campos, nós lutaremos nas colinas, nós nunca nos renderemos (1940).
Se O Destino de uma Nação foca nos bastidores políticos que levaram à operação “Dínamo”, Dunkirk retrata a operação em si. Também lançado em 2017, em 27 de julho, o filme foi dirigido por Christopher Nolan e envolve quatro nacionalidades (EUA, Reino Unido, França e Holanda); com 106 minutos de duração, possui drama e ação como gêneros.
A maior parte da trama está ambientada nas praias de Dunquerque e apresenta o drama vivido pelos soldados ao longo de evacuação. Além das dificuldades em terra, considerando a grande quantidade de pessoas a serem resgatadas, dentre elas os feridos, esses homens lidavam ainda com os constantes bombardeios cometidos pela Força Aérea Alemã (Luftwaffe). Nesse contexto, Dunkirk aborda não apenas o esforço da Marinha Britânica e da população civil no salvamento dos soldados, mas também a importante atuação da Força Aérea Real (Royal Air Force), que lutava para impedir os ataques nazistas.
Através da vivência do jovem soldado britânico Tommy (Fion Whithehead), a película refere-se à operação “Dínamo” a partir de diversos pontos: as consequências psicológicas provocadas nos soldados em decorrência das agressões sofridas; a hierarquia estabelecida durante o resgate, à medida que a prioridade dos embarques recaia nos britânicos, em detrimento de homens de outras nacionalidades, como França; os torpedeamentos efetuados por submarinos alemães ao longo do percurso; o patriotismo e a bravura da população civil britânica, que se dispôs a atuar na operação através do uso de pequenas embarcações. Em especial, essa última característica, também é enfatizada na película dirigida por Wright.
Além dessa, outras semelhanças entre os filmes são o ano em que foram lançados (2017) e, principalmente, o fato de ambos basearem seu enredo, mesmo que em perspectivas distintas, no mesmo evento histórico, isto é, uma das principais operações da II Guerra Mundial, tema que continua a suscitar diversos tipos de produções, a exemplo das cinematográficas. E quando falo em cinema, me refiro a uma indústria do entretenimento, que possui objetivos comerciais muito bem delineados.
Sendo assim, mesmo que retratem um evento histórico, ambas as películas são constituídas, também, por elementos ficcionais, que visam atrair a atenção do público, não podendo ser encaradas como uma verdade absoluta do que ocorreu em relação à operação “Dínamo”. Isso, porém, não as torna produções menos importantes, principalmente se pensarmos que os filmes são frutos do tempo e da sociedade que os produzem. Desse modo, fica a reflexão de como a II Guerra Mundial, passados mais de 75 anos, permanece como um tema que tanto influencia o nosso tempo, e como o resgate da sua memória continua sendo feito por diferentes países, a exemplo do Reino Unido, que teve na operação “Dínamo” um dos momentos cruciais para o seu desempenho no conflito. É forte na memória dos britânicos a imagem de resistência que esse episódio representou.
Para saber mais:
GILBERT, Martin. Dunquerque | Maio de 1940. In.: A Segunda Guerra Mundial: os 2.173 dias que mudaram o mundo. Tradução de Ana Luísa Faria e Miguel Serras Pereira. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2014, p. 103-114.
O texto integra atividades do projeto “O Pearl Harbor brasileiro: o cotidiano de Sergipe na Segunda Guerra (1942-1945)”, apoiado pelo CNPq através do Edital Universal 2018.
Originalmente publicado em: https://infonet.com.br/blogs/o-resgate-da-memoria-da-ii-guerra-mundial-no-cinema/ em 28/10/2021