Katty Cristina Lima Sá
Mestre em História Comparada pela UFRJ
Integrante do Grupo de Estudos do Tempo Presente (GET/UFS)
E-mail: katty@getempo.org
As imagens de radicais islâmicos em esconderijos distantes, com roupas de combate, turbantes e longas barbas alimentou a ideia de que esses homens eram renunciadores do mundo moderno; pensamento esse que está incorreto. Na realidade, os jihadistas foram hábeis em apropriar-se dos meios de comunicação mais importantes do seu tempo. O próprio Osama Bin Laden (1957-2011), fundador da Al-Qaeda, apareceu voluntariamente na mídia através de concessões de entrevistas e por meio de áudios enviados às emissoras jornalísticas, com destaque para a Al-Jazeera. Contudo, o anseio por visibilidade não se tratava de exibicionismo, mas da tentativa de tornar aquela organização conhecida mundialmente.
Com ampliação do acesso à internet nos anos de 1990, novas possibilidades para a comunicação e propaganda foram abertas aos “simpatizantes da jihad”. A troca de e-mails e a conversa em chats auxiliaram no planejamento dos atentados de 11 de setembro de 2001, sendo que, um ano antes, o primeiro site ligado à Al-Qaeda, o maalemaljihad.com, havia sido lançado. Nos cinco anos seguintes, o número de páginas semelhantes havia alcançado o número de 4.300. Mais próximo ao nosso tempo, em 2015, era possível assistir a vídeos de extremistas atuantes pela Al-Qaeda no Iêmen na plataforma de vídeos YouTube, ou ainda ter informações sobre o avanço do Estado Islâmico (ISIS) na Síria através de tweets de seus combatentes.
As vantagens dos usos da internet, sobretudo das redes sociais, para a difusão de uma causa já são conhecidas pelo público em geral: os custos são baixos e o alcance amplo. No entanto, para os jihadistas, e para grupos extremistas de outras vertentes, a formação de comunidades virtuais também é essencial. Por meio dessas, o entusiasta se insere nos meios culturais e sociais da jihad, ambientes que não são formados apenas por vídeos com atos violentos, como também por poesias, cânticos e sermões que exaltam as glórias de viver, e de morrer, em uma jihad. Com isso, procura-se criar uma identidade coletiva entre os membros das comunidades, o que é fundamental para o recrutamento.
Lembremos que, segundo o Corão, a jihad não é uma guerra contra aqueles que se opõem a uma visão fechada do Islã, mas uma luta interna para manter-se fiel aos ensinamentos de Deus. Ela é entendida fora dos preceitos pacíficos por grupos radicais que possuem objetivos políticos e que não abrem mão de divulgar suas causas através de variados meios de comunicação. Os motivos para a insistência na propaganda perpassam tanto pelo anseio das organizações de fazerem-se conhecidas, como pelo de criar comunidades virtuais que suscitem novas adesões. A sedução de jovens a causas extremistas muitas vezes parece ocorrer de modo solitário; porém, por trás das telas, sempre haverá uma comunidade de possíveis aliciadores.
Originalmente publicado em: https://infonet.com.br/blogs/a-jihad-atraves-de-views-os-usos-da-internet-por-grupos-jihadistas/ em 10/09/2020
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